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Temperatura do mar ajuda a prever período de estiagem no Nordeste

Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

A temperatura das águas do oceano Atlântico Norte pode ser usada como um indicador climático para prever com antecedência de até três meses períodos de eventos extremos ligados à redução de chuvas e secas intensas na região Nordeste do Brasil. Essa é uma das principais conclusões de um estudo publicado na revista científica Geophysical Research Letters, que envolveu pesquisadores do Brasil, China, Austrália e Alemanha.
O grupo aplicou uma nova abordagem metodológica, com foco no déficit de precipitação, e mostrou que, nos últimos anos, a influência do Atlântico Norte se tornou mais persistente do que a atuação do Pacífico tropical, até então apontada como um dos fatores de impacto na intensidade das secas no Nordeste. Ao mesmo tempo, a conexão entre Pacífico e Atlântico Norte ficou mais frequente, sugerindo que essas interações entre as bacias oceânicas tropicais reforçaram as estiagens na região nas últimas décadas.
“O trabalho foi motivado pela grande seca registrada entre 2012 e 2015. Esse longo período nos fez refletir, do ponto de vista meteorológico, como as temperaturas dos oceanos tropicais influenciam essas condições climáticas. O diferencial agora é a metodologia inovadora, que explora a questão das diferentes áreas do Pacífico e do Atlântico e o padrão de seca no Nordeste. Esses resultados servem como ferramenta de gestão para que centros meteorológicos façam a previsão com antecedência de eventos com esse potencial”, diz à Agência FAPESP Lincoln Muniz Alves, cientista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e um dos autores do artigo.
O estudo teve o apoio da FAPESP por meio de um Projeto Temático, ligado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC) e cujo pesquisador responsável é o professor Elbert Einstein Nehrer Macau, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A seca que atingiu o semiárido do Nordeste entre 2012 e 2015 teve intensidade e impacto recordes, destruindo áreas agrícolas, levando à falta de água e afetando cidades e pequenas localidades. Outros trabalhos já apontaram como causas dessa situação as alterações na circulação atmosférica, sugerindo um papel ativo das águas superficiais mais quentes do que o normal no oceano Atlântico. O El Niño, fenômeno climático que envolve um aquecimento incomum do Pacífico, também contribuiu com o agravamento do quadro.
À época, o El Niño foi considerado um dos que tiveram maior impacto (depois dos registrados em 1982-1983 e 1997-1998), provocando perdas em diferentes regiões do mundo. No Brasil, houve seca intensa no Nordeste e na Amazônia, estiagem prolongada no Norte, no centro-norte de Minas, de Goiás e no Distrito Federal, além de inundações no Sul.
Os estudos concluíram que o gráfico de preciptações não segue uma lógica em reta. “Não existe mais um padrão normal ou de linearidade, como se observava havia três décadas. Vários outros trabalhos têm corroborado com o resultado que obtivemos. Essa metodologia revela que não existe um padrão linear para montar as previsões. A pesquisa mostra que é preciso sair do convencional e destaca a importância de olhar para outras áreas dos oceanos, não focando somente no Pacífico”, afirma Alves.
Entre as conclusões do artigo, o grupo aponta ainda que outros fatores, como mudanças no uso da terra, podem levar a alterações no ciclo hidrológico, como já demonstrado em estudos de modelagem, particularmente sobre a bacia amazônica. Por isso, os cientistas sugerem que novos trabalhos com a metodologia desenvolvida podem focar em como essas mudanças no uso da terra alteram as características e interações climáticas.
“Quando discutimos variações climáticas estamos falando também em impactos socioeconômicos e na biodiversidade. Por isso, centros meteorológicos podem usar o modelo para trabalhar em prevenção, focando em políticas públicas ou na tomada de decisão sobre ações de mitigação de eventos extremos”, completa o professor.
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