O vice-presidente do PSL, Antonio Rueda, com aval do clã Bolsonaro, organiza a volta dos deputados bolsonaristas afastados do partido após o racha entre o presidente da sigla, o deputado Luciano Bivar (PE), e o presidente Jair Bolsonaro, hoje sem legenda.
Rueda virou peça-chave na negociação política que ocorre nove meses após Bolsonaro dizer para um apoiador esquecer o PSL. Há um mês, ele articulou uma ligação entre o presidente e Bivar.
Foi a primeira vez que Bivar e o mandatário se falaram desde a crise que levou à saída de Bolsonaro da legenda, em novembro de 2019. O presidente chegou a dizer a um apoiador que Bivar estava “queimado para caramba”.
Rueda nega ter tido participação direta no gesto, mas a Folha confirmou com outras duas fontes o papel do advogado na reaproximação. “Como dirigente partidário eu tenho de estar aberto sempre ao diálogo”, afirmou ele.
Na última quinta-feira (13), os sinais de fumaça da reconciliação se tornaram públicos. Em sua live semanal, Bolsonaro cogitou a volta ao PSL ao falar da possibilidade de se filiar a outros três partidos.
“Tem uma quarta hipótese: o PSL. Alguns sinalizaram uma reconciliação. A gente bota as condições na mesa para reconciliar e eles botam de lá para cá também”, disse.
Bolsonaro afirmou ainda que não deve se concretizar a expectativa de que a Aliança pelo Brasil —partido ainda não criado e que reuniria o bolsonarismo— fique pronta neste ano.
De perfil discreto, Rueda comanda essa articulação política de dois imóveis localizados no Lago Sul de Brasília.
Um deles, o escritório localizado perto da embaixada do Kuait, é compartilhado com Otávio Noronha, filho do presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), João Otávio de Noronha.
Durante o recesso judiciário em julho, Noronha determinou a conversão, de preventiva para domiciliar, da prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e amigo do presidente.
Queiroz é suspeito de coletar durante anos parte dos salários de funcionários do gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro quando o hoje senador exercia o mandato de deputado estadual, caso conhecido como “rachadinha”.
A decisão foi derrubada na última quinta-feira pelo ministro Félix Fischer, que mandou o ex-policial militar de volta à prisão. Horas depois, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes revogou a decisão de Fischer.
O outro ponto de articulação política é a casa de Rueda. Ele recebe dirigentes e autoridades, entre elas o presidente do STJ, que já esteve ao menos duas vezes em eventos realizados no local.
Em nota, Noronha afirmou que conhece Rueda e já frequentou sua residência em duas oportunidades para eventos com a presença de “outras autoridades”. Ele negou ter tido qualquer encontro ou conversa com Bolsonaro intermediado pelo advogado.
Sobre a relação de Otávio Noronha com o dirigente do PSL, ele disse que “não se envolve nas questões profissionais do seu filho”. Procurado pela Folha, o filho do presidente do STJ não respondeu.
Flávio Bolsonaro é outro frequentador habitual da residência do vice-presidente do PSL. Os dois são amigos e se tornaram os principais articuladores do acordo.
Rueda tenta garantir a Bolsonaro e seus filhos acesso ao cofre do PSL —o principal entrave da disputa política pelo comando do partido em 2019. O vice-presidente da sigla comanda indiretamente as finanças.
Bivar é ainda resistente à ideia. Ele deu sinais a aliados nas últimas semanas de que pode não ceder, mas compartilhar indiretamente espaços de comando na legenda com o presidente da República.
Oficialmente, Bivar negou a articulação. “Isso não foi colocado na mesa”, disse.
O PSL vai receber em 2020 a segunda maior fatia do fundo partidário: R$ 201,1 milhões. A sigla fica atrás apenas do PT, que receberá R$ 204,6 milhões.
A flexibilização de Bivar reflete o fortalecimento de Bolsonaro. A avaliação feita por aliados do dirigente é que o presidente da República será o principal cabo eleitoral das eleições municipais.
A mais recente pesquisa Datafolha mostra que 37% dos brasileiros consideram o governo Bolsonaro ótimo ou bom, ante 32% na pesquisa anterior, de junho. A rejeição —ruim ou péssimo— caiu de 44% para 34%. Consideram regular 27%, ante 23% em junho.
No último mês, Bolsonaro moderou as declarações contra adversários, parou de dar corda a apoiadores radicais e adotou pragmatismo nas relações políticas com o Congresso.
Um dos personagens que ajudaram a fazer a cabeça de Bolsonaro para reaproximá-lo de Bivar foi o líder do PP na Câmara, deputado Arthur Lira (AL). Ele é o principal fiador da adesão do chamado centrão ao Planalto.
Na semana passada, Lira compareceu a um jantar de confraternização na casa de Rueda.
Além dele, estiveram no local os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-AL), relator da proposta de reforma tributária. “Passaram apenas para dar um abraço. Sou grato pela consideração”, afirmou Rueda.
Bolsonaro quer também garantir espaços políticos de aliados. No Rio de Janeiro, o PSL, que estava nas mãos de Flávio, hoje está sob a tutela do deputado federal Sargento Gurgel. O parlamentar já se acertou com o senador e abriu espaço a bolsonaristas fluminenses, como o deputado Daniel Silveira, pré-candidato a prefeito em Petrópolis.
O principal entrave ao acordo está em São Paulo. Os deputados Júnior Bozzella e Joice Hasselmann são contrários à volta dos desgarrados.
Rueda quer devolver o diretório ao deputado federal Eduardo Bolsonaro. Na última quinta, logo após Bolsonaro sinalizar que poderia voltar à legenda, Bozzella contra-atacou.
“Agradecemos ao presidente Jair Bolsonaro o seu reconhecimento de que o PSL é um grande partido, de gente séria e equilibrada, ao solicitar o seu retorno para agremiação. Mas, como um partido liberal e democrático, deputados acharam por bem não aceitar”, disse.
Na sexta-feira (14), Bivar confirmou as negociações. “Um grupo de deputados da ala bolsonarista está nos procurando pedindo que haja um tipo de revisionamento na punição, que se extingue em janeiro, para que se antecipe isso e tenha uma vida regulamentada.”
“Esse é um assunto de um grupo específico de deputados que está conversando com a nossa executiva sobre isso, nada mais do que isso”, afirmou Bivar.