A ideia surgiu como opção criativa para não ter que enfrentar uma viagem de dez horas de trem para visitar a namorada. Em 1987, Eric Yuan era um estudante de matemática aplicada da universidade chinesa de Shandong e buscava uma maneira mais fácil de interagir com a garota por quem estava apaixonado.
O conceito virou produto somente 24 anos depois, em meados de 2011, mas o programa de voz, vídeo e —agora sabemos— reuniões e festas online renderam ao empresário um casamento, três filhos e seu rosto estampado pela primeira vez na lista de bilionários da revista Forbes.
Eric Yuan é o fundador da empresa de videoconferência Zoom, que se popularizou durante a pandemia do coronavírus por permitir reuniões de até 500 pessoas em meio a regras de distanciamento social.
Se antes da quarentena o Zoom tinha cerca de 10 milhões de participações em reuniões por dia, hoje são 300 milhões, mesmo com as ameaças de ataques virtuais que colocaram em risco a privacidade dos usuários.
A fortuna de Yuan acompanhou a escalada de acessos. Aos 49 anos, quase metade deles vividos nos Estados Unidos, o chinês viu seu patrimônio chegar a US$ 7,8 bilhões (quase R$ 45 bilhões) em 2020 --US$ 4 bilhões (R$ 22 bilhões) somente nos três primeiros meses do ano.
Em dois meses, as ações do Zoom subiram 50% --enquanto as bolsas derretiam em meio à crise. A empresa, que valia US$ 29 bilhões (R$ 159 bilhões) antes da pandemia, passou a ser cotada em US$ 44 bilhões (R$ 241 bilhões).
"Sinto que foi da noite para o dia, em todos os países todo mundo percebeu que precisava de uma ferramenta como o Zoom para se conectar", disse Yuan à Forbes. "Dessa perspectiva, estamos muito orgulhosos. Vimos que com o que estamos fazendo aqui podemos contribuir um pouco para o mundo."
Mas nem sempre foi assim. Nascido na província de Shandong, no leste da China, o filho de engenheiros de mineração teve seu visto negado oito vezes até entrar nos EUA.
Antes de viver o sonho americano, fez mestrado em engenharia na China e, depois, trabalhou por quatro anos no Japão, onde ouviu uma palestra do Bill Gates, fundador da Microsoft, que o inspirou a tentar a vida no Vale do Silício.
Sem falar inglês, chegou à Califórnia em 1997, aos 27 anos, e trabalhou em uma empresa de tecnologia que mais tarde foi comprada pela Cisco Systems. Em 2011, apresentou o projeto de teleconferência que funcionaria inclusive via celular para a Cisco e, diante da negativa da empresa, entregou o cargo de vice-presidente de engenharia para investir no próprio negócio.
Demorou para encontrar investidores, pediu dinheiro emprestado a amigos e familiares, e mandava email para cada usuário que cancelava o serviço. Dizia que era a melhor forma de aprimorar a plataforma.
Desde que estreou na bolsa digital Nasdaq, há um ano, o Zoom conseguiu melhor desempenho na categoria software em nuvem do que suas concorrentes, Microsoft e Cisco Systems, com pico nos últimos três meses.
Com a demanda aumentando em 2020, Yuan afirma que mantém a tradição de envolvimento pessoal no negócio. Tem trabalhado em novos recursos focados no trabalho remoto, como melhora na qualidade da iluminação do rosto das chamadas e ferramentas para palestras de professores.
Com escolas e universidades fechadas em vários países do mundo, o Zoom passou a ser bastante utilizado para aulas online.
Uma das chaves para que o programa se destacasse diante de concorrentes como Skype (da Microsoft) e Meet (do Google), por exemplo, é que as chamadas do Zoom são grátis por até 40 minutos, aceitam até 100 pessoas na versão gratuita (até 500 na paga), e não é preciso se inscrever.
As facilidades, porém, abriram um flanco importante de privacidade que abalou a reputação da empresa, envolvendo o governo britânico e a polícia federal americana.
Em março, o FBI pediu que a população dos EUA reportasse invasões em reuniões feitas por aplicativos de teleconferência por causa de uma prática que ficou conhecida como "zoombombing."
As invasões de reuniões alheias iam de pornografia ao nazismo e acenderam o alerta de autoridades, políticos e pesquisadores de segurança. Estes, por sua vez, afirmam que o Zoom agiu rápido frente aos problemas e providenciou grande parte do recall com eficácia.
Além do zoombombing, a companhia foi acusada de repassar dados ao Facebook, de criptografia frágil e de potencial ligação com a China --o que levou a inteligência britânica a solicitar que o governo não tratasse de informações confidenciais via Zoom.
Yuan admite que privacidade não era sua prioridade no passado, mas o cenário mudou após a série de erros.
O empresário anunciou recentemente a formação de um conselho com foco em segurança na empresa e contratou como consultor Alex Stamos, chefe de segurança do Facebook durante as eleições presidenciais nos EUA em 2016.
Naquele ano, a Rússia usou a rede social para espalhar desinformação e influenciar a eleição que levou Donald Trump à Casa Branca.